‘Como a governança corporativa pode transformar um negócio em ícone’
A indústria do luxo é, sem dúvida, um dos setores mais fascinantes do mundo dos negócios. Marcas como Louis Vuitton, Gucci e Hermès são sinônimos de excelência, exclusividade e poder. Entretanto, ao longo da história, essas marcas enfrentaram crises econômicas severas e transformações globais que testaram sua resiliência. Como elas conseguiram não apenas sobreviver, mas prosperar, criando verdadeiros impérios? A resposta está na profissionalização e na adoção de práticas robustas de governança corporativa.
Se pensarmos no contexto histórico do tema, nos últimos cem anos, o mercado de luxo passou por diferentes fases de crescimento e retração. Crises econômicas globais, como a Grande Depressão de 1929, as crises do petróleo nas décadas de 1970 e 1980, e, mais recentemente, a crise financeira de 2008, impuseram desafios consideráveis a essas marcas.
Durante esses momentos de adversidade, muitas marcas menores e independentes enfrentaram dificuldades, não apenas por conta da redução do consumo, mas também pela falta de estrutura organizacional para se adaptar a mudanças drásticas. Marcas familiares, muitas vezes geridas de maneira tradicional, foram forçadas a rever suas estratégias.
Nos anos 1980 e 1990, um movimento estratégico importante tomou conta do setor: a consolidação das marcas de luxo sob grandes conglomerados. Grupos como LVMH, Kering e Richemont começaram a adquirir marcas icônicas, transformando o cenário de uma indústria composta por marcas independentes para uma de grandes holdings. Esse movimento, embora visto inicialmente com cautela, provou ser uma das estratégias mais eficazes para a sustentabilidade das marcas de luxo.
LVMH: Um Case de Sucesso
Louis Vuitton Moët Hennessy (LVMH) é um exemplo emblemático. Sob a liderança de Bernard Arnault, o grupo adotou uma abordagem agressiva de aquisições, incluindo marcas como Fendi, Givenchy, e a própria Louis Vuitton. Ao integrar essas marcas sob um mesmo guarda-chuva corporativo, o grupo conseguiu fornecer não apenas capital financeiro, mas também expertise em governança corporativa, ajudando a otimizar a gestão dessas empresas e proteger sua herança.
A profissionalização da gestão e a criação de sinergias entre marcas do mesmo grupo permitiram um crescimento estruturado. Por exemplo, as práticas de compartilhamento de supply chain, marketing e vendas criaram eficiência operacional, enquanto a governança corporativa foi reforçada com a adoção de conselhos administrativos com forte influência estratégica.
Governança corporativa: o alicerce do crescimento
Como visto no case acima, a governança corporativa, quando bem aplicada, torna-se um pilar essencial para a sustentabilidade e o crescimento das empresas. Segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), a governança envolve um conjunto de regras e práticas que garantem a transparência, equidade e responsabilidade nas decisões estratégicas de uma empresa. No caso das marcas de luxo, isso significa garantir que, enquanto a marca cresce, sua essência e seus valores não sejam diluídos, protegendo a história e o DNA da marca.
Em um cenário onde as empresas familiares, com culturas fortemente arraigadas, foram forçadas a se integrar a conglomerados, a governança foi fundamental para manter o equilíbrio entre tradição e inovação.
A partir do momento em que as marcas de luxo passaram a integrar grandes grupos, a necessidade de transparência aumentou. A implementação de práticas de governança, como auditorias internas, conselhos administrativos com membros independentes e a criação de processos claros de tomada de decisão, permitiu que essas marcas fossem mais ágeis e eficientes em tempos de crise.
A transparência é fundamental, pois permite que todas as partes interessadas – acionistas, funcionários, clientes e a própria sociedade – saibam exatamente como o negócio está sendo gerido. No caso das marcas de luxo, a confiança do consumidor é inestimável, e a governança desempenha um papel crucial na manutenção dessa confiança.
Um dos grandes fatores que diferencia as marcas de luxo que sobreviveram às crises daquelas que sucumbiram é a profissionalização da gestão. Em décadas passadas, muitas dessas marcas eram negócios familiares, liderados por herdeiros que nem sempre estavam preparados para lidar com a complexidade dos mercados globais. A entrada de gestores profissionais, com experiência em finanças, operações e marketing, permitiu que as marcas mantivessem sua identidade enquanto adotavam práticas de gestão modernas e eficazes.
A profissionalização também teve um impacto direto na maneira como as marcas se relacionam com seus consumidores. Nos dias atuais, o cliente de luxo é exigente e busca mais do que um produto: ele busca uma experiência única. A capacidade de entregar essa experiência é resultado de uma gestão eficiente e alinhada com as expectativas de um mercado globalizado.
Além disso, nos últimos anos, um novo desafio surgiu para as marcas de luxo: a sustentabilidade. Consumidores e investidores estão cada vez mais preocupados com práticas éticas e sustentáveis, e as marcas de luxo, antes associadas ao consumo excessivo, tiveram que se adaptar. A LVMH, por exemplo, lançou iniciativas robustas em direção à sustentabilidade, adotando práticas de produção mais ecológicas e buscando a certificação de suas operações. Isso não só reflete a adoção de uma governança moderna, mas também demonstra como essas organizações estão dispostas a se reinventar sem comprometer sua essência.
A profissionalização e a adoção de práticas de governança corporativa foram fundamentais para transformar marcas de luxo em impérios globais. Hoje, as marcas que se adaptaram a essas mudanças não apenas sobreviveram, mas também prosperaram, criando uma nova era de luxo.
Como podemos ver, a governança não é apenas uma questão de conformidade, é um diferencial competitivo. Para marcas de luxo, isso significa preservar a tradição e, ao mesmo tempo, adotar inovações que garantam relevância em um mercado em constante transformação. Se olharmos a diante, veremos que o sucesso contínuo dessas marcas estará diretamente ligado à sua capacidade de governança e à manutenção de uma cultura corporativa que respeite o passado, mas que esteja disposta a abraçar o futuro.
Essa é a verdadeira essência do luxo: não apenas produtos, mas uma gestão impecável, com visão de longo prazo que transformam marcas em ícones atemporais.
Por Fátima Bana