Experiências pessoais podem ajudar a conquistar uma vaga de trabalho, mas informações do tipo podem interferir nas escolhas dos colaboradores e ultrapassar o limite entre trabalho e lazer Tocar um instrumento musical, praticar esportes, tirar fotos, fazer artesanato, jardinagem e até dança pode ser um diferencial para colocar no currículo e até conquistar uma vaga de trabalho. As chamadas mad skills, que pode ser traduzida para habilidades incríveis, já são avaliadas por recrutadores e empresas na hora da contratação de um profissional lá na Europa. O mesmo começa acontecer aqui no Brasil desde o ano passado.
A teoria sobre entender mais sobre o comportamento de um profissional por meio dos seus gostos e atividades pessoais parece focar nas experiências de vida e em outras características que não se enquadram no hard skills (formação técnica e acadêmica) e no soft skills (habilidades socioemocionais). Porém, até que ponto isso pode ser realmente saudável e não atrapalhar na espontaneidade das pessoas?
Para a psicóloga e professora de pós-graduação da PUCPR Mariana Holanda, pioneira no cargo de direção de saúde mental em uma das grandes empresas no Brasil, a tendência pode até ter uma teoria interessante, mas a prática é completamente diferente.
“Precisamos entender que tentar fazer uma leitura das experiências de vidas vai além de colocar em um currículo seus hobbies. As atividades pessoais revelam bastante sobre a vida de uma pessoa, porém colocar elas como diferencial numa entrevista pode esbarrar no limite entre trabalho e lazer”.
Mariana acredita que profissionalizar o hobbie é resultado de uma cultura que tem buscado a produtividade a qualquer custo: “Estamos tão imersos na produtividade que o hobbie virar uma régua é sim mais um sinal de alerta. Se por um lado agora temos dados mostrando o quando os hobbies são importantes para uma boa qualidade de vida, e automaticamente na melhoria do rendimento pessoal e profissional, por outro agora estamos usando mais uma métrica pessoal como critério de avaliação pessoal, reforçando ainda mais uma sociedade viciada em desempenho, e tirando das pessoas o pouco que resta de leveza, descanso, ócio e liberdade”, explica. Outro ponto levantado pela especialista é que muitas pessoas sequer têm tempo real de se dedicar aos hobbies. “A realidade hoje das pessoas na equação trabalho e descanso é outra e para a maior parte da população brasileira. Ainda estamos falando sobre precarização do trabalho, existem pessoas que gastam horas indo e vindo para o trabalho, em muitos casos também exerce sua atividade profissional no fim de semana. Esse “diferencial” pode se tornar uma autocobrança dentro de um cenário sem recursos para a maioria das pessoas que buscam conquistar uma vaga”, exemplifica ela.
Mariana coloca luz em um outro ponto fundamental: o da espontaneidade das pessoas. “É possível que muitas pessoas passem a fazer coisas que sejam atrativas aos olhos de quem contrata, mas que na verdade sequer realmente gostam daquilo. Precisamos ficar atentos aos limites que garantem esse espaço de liberdade. Não há dúvidas que precisamos discutir outras coisas mais importantes do que colocar os hobbies como critério de seleção na hora de uma contratação”, finaliza a especialista.
Sobre Mariana Holanda:
Mariana Holanda é graduada em Psicologia, com MBA em Gestão Empresarial, facilitadora internacional de Segurança Psicológica de Times, e há mais de 11 anos atua na área de Gente, Gestão e de Desenvolvimento de Pessoas. Foi a primeira Diretora de Saúde Mental do mercado, dentro de uma grande e reconhecida empresa multinacional, e participou ativamente dos processos de transformação cultural e gestão de conflitos, liderando times de alta performance, e trazendo a importância da sustentabilidade humana para dentro da estratégia das organizações.
Hoje é consultora, board member, palestrante, mentora empresarial, e também professora. “Minha missão é apoiar líderes e equipes a atingirem seu potencial através do autoconhecimento e escolhas conscientes.”